segunda-feira, 27 de junho de 2011

Acordado: A Decisão


     O ventilador gira e gira acima de mim em seu eterno trabalho e assim como minha vida, não sai do lugar. Deitado em algo que já não julgo como minha cama, mas sim um antro de perdição, pois nela eu penso, reflito e decido nunca tomar decisões e quando raramente tomo-as já se foi o pôr-do-sol vivente. Não vejo sentidos nas direções que tenho tomado e isso me inquieta, me atormenta pesadamente.
     As cobertas tentam me prender como correntes, elas pesam sobre meu corpo como o fantasma que rodeia as cortinas de minha mente. Olhos que vagam calmamente pelos vazios espaços do quarto e só veem o resquício das atitudes de minha autoria, uma bagunça sem limites, porém esperada, pois eu parara de organizar há dias. O tempo nem faz mais sentido, agora é só uma forma tola de controle que o ser humano criou para si mesmo.
     
     (Branco).. Acordar e levantar passam a serem torturas hediondas quando sua vida segue sempre na mesma direção, contudo o pânico dessa ideia passou, pois me tornei parte dele, seu escravo mais devoto. De frente para o espelho vejo o meu eu desgarrado, aquela coisa de o tempo não fazer sentido não vale para meu corpo, porquanto a barba cresce malfeita e rala. O cabelo que já fora sedoso e bem cuidado sente o efeito da falta d’água e de pente. Como pude me tornar alguém tão desprezível de alma e corpo?
     
     Lá no mais profundo alento jaz uma vontade de bravos, uma vontade que eu não sinto a tanto que chega a doer. Mudar. Droga! Estou há tanto neste abismo de mesmice que vem estranha a sensação de uma nova faísca de esperança.
     Meus pés me guiam passo-a-passo por uma volta na casa. Essas lembranças, todas elas machucam-me como os golpes de um açoite de ferro. Lágrimas correm desenfreadas pela face despojada e se vão para cumprir seu ciclo. Posto-me a andar..
      
     (Branco).. A porta da frente do que eu chamo de minha casa, talvez seja ela que me levará a outro mundo ou pelo menos fará parar essas vozes de tentação. Talvez se eu passa-la.. Talvez. Com um rápido movimento a mão pega e gira a maçaneta, mas a visão causa decepção aos olhos. A mesma merda de ruazinha de sempre, com suas pessoinhas problemáticas e que se contentam em viver no limbo da mesmice. Tenho que fazer algo, mas se torna difícil saber o que é. Vou pensar, ah sim eu vou!
     
     (Branco).. AHHH QUE DOR! Minha cabeça vai explodir? Se eu morrer vou ter a paz que preciso? AHHHH..
     
     (Branco).. Estacado, contemplando a frente de “minha casa” e com o isqueiro importado do meu pai na mão. Uma fina linha de líquido vem em minha direção e morre no escuro do batente, o forte cheiro de álcool entra pelas narinas trazido pela brisa. Uma pequena esperança nasce em meu sombrio coração. A chama do isqueiro dança brincalhona e pede para encontrar o líquido inflamável e eu sinto que esse pode ser o caminho para encontrar minha salvação. É como alguém pensou uma vez, eu preciso disso como uma águia precisa voar.
     
     Um único movimento e o pequeno objeto cruza o ar caindo no chão e criando uma serpente de fogo que desliza até o obscuro interno da casa. Línguas de fogo cortam o céu engolindo a construção e fazendo a madeira estalar pedindo ajuda, porém eu viro a costa para minha antiga vida e me posto a andar sem rumo algum pensando que o destino pode estar contra mim, mas ele jamais vencerá esta guerra.

 DLuppus

2 comentários:

  1. Menino de incontáveis palavras enigmáticas. Imagino você andando, pensando e imaginando cada palavra para descrever o que sua mente e alma tanto anseiam para jogar, vomitar para o mundo lá fora. Palavras lindas, complexas e singelas que me botam dentro de um lugar escuro e é como se a cada palavra/frase/linha, fosse um tiquinho de luz em meio as trevas. Não pare de ser assim, não deixe de trazer imensidão para as coisas que na maioria das vezes, são simples e pequenas demais. Adorei!

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  2. Meus parabéns novamente, ótimo post!
    Realista e muito sensível

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